A liberdade da linguagem do desejo do corpo na alma: a doutrina do amor em Hadewijch da Antuérpia e em Ricardo de São Vítor

Autores

  • Maria José Caldeira do Amaral

Resumo

No corpo da literatura vernacular medieval, a obra (poemas, visões e cartas) de Hadewijch da Antuérpia, beguina que viveu no século XIII alcança, de acordo com vários estudiosos modernos, o status de uma obra respeitada e construída a partir de um conhecimento profundo, com significativa sustentação psicológica na linguagem de sua experiência de ascese, contemplação e ação, a partir da inserção natural de um saber fundamental próprio de autores medievais e pré medievais dentro do escopo scholar do Cristianismo Ocidental. Essa comunicação tem como objetivo principal, desenvolver e apontar, analogicamente, no conteúdo intrínseco de sua obra poética e profética, sua doutrina de que é preciso viver o Amor. Mas, para ela, diferente de muitos autores medievais, a experiência de amar e desejar Deus não abarca a beatitude e o arroubo do êxtase somente. O desejo associado à experiência do amar expõe, em toda sua obra, o conhecimento da maior e principal pulsão humana como provedora do conhecimento. O desejo traduzido como falta e o amor traduzido como abismo inclui a ausência desse Amor, como a mais profunda e essencial experiência humana provedora de conhecimento. Como Ricardo de São Vítor - Prior na Escola de São Vitor e discípulo do eminente mestre Hugo de São Vítor, Hadewijch da Antuérpia sofre de um amar como impossibilidade da satisfação do amor como a forma mais alta de amor. A condição da alma fervorosa e ardente que conhece o desejo do amor pelo Amor como negação (conceito esse já desenvolvido por Gregório de Nissa, Pseudo Dionísio, Máximo Confessor e Gregório Palamas) é aquela condição que supõe a experiência de desejo como uma experiência que já não pode ser satisfeita de nenhum modo. Sedenta e faminta, a alma experimenta a perturbação, a tortura sem piedade e todas as condenações e destruições das quais o amor é capaz. O tormento e a loucura estão disponibilizados nos registros de Hadewijch da Antuérpia e de Ricardo de São Vitor em “Os quatro graus do amor violento”, atendendo à ideia de que a linguagem de ambos experimenta o desespero na veemente incidência da impossibilidade da alma mística cristã desconhecer e não experimentar o desejo daquele Amor, que é absoluto na alma inquieta que conhece a liberdade. Somente a renúncia livre de Deus à sua própria deidade concede a licença para a liberdade da alma e do corpo humanos. De corpo e alma, o homem e a mulher que sabem o Amor, livres e atormentados, enlouquecem, ainda que conscientes de sua loucura, e enfrentam o drama de suas escolhas e a impossibilidade em provê-las diante das exigências do Amor vivido em ausência.

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Publicado

2019-11-26

Como Citar

Amaral, M. J. C. do. (2019). A liberdade da linguagem do desejo do corpo na alma: a doutrina do amor em Hadewijch da Antuérpia e em Ricardo de São Vítor. Annales Faje, 4(3), 77–84. Recuperado de https://www.faje.edu.br/periodicos/index.php/annales/article/view/4317