O desafio do progresso para o melhor: direito e paz perpétua da filosofia da história cosmopolita de Kant para o mundo contemporâneo

Autores

  • Isabela Antônia Rodrigues de Almeida
  • Igor Moraes Santos

Resumo

As preocupações que movem a filosofia da história de Kant permanecem como objeto de inquietações da filosofia político-jurídica na contemporaneidade, o que faz dela um dos mais atuais intentos reflexivos da tradição ocidental. Entre as principais, ele reconhece na paz perpétua o bem supremo da espécie humana. Entretanto, como o homem ainda está longe de alcançá-la, busca identificar os caminhos necessários para tanto, o que pretendemos aqui evidenciar, contrastando passos dados e novos desafios. O primeiro deles é uma constituição civil republicana. Kant concebe o Estado como racional, a serviço da liberdade externa, assegurada através da coação. Constituindo-se como república, tem-se um poder soberano competente para criar leis e representante da vontade geral, esta entendida como possibilidade de aprovação da lei em virtude de sua racionalidade. Assim, Kant firma a fundamentação do Estado na liberdade e, em harmonia com o seu projeto moral, reconhece dignidade racional ao homem. Para tanto, o Direito tem seu primeiro papel ao garantir uma comunidade racional e livre. Com efeito, os cidadãos devem ter liberdade, como faculdade de obedecer a leis para as quais tenham dado ou possam dar assentimento, ao passo que iguais perante elas e independentes. Ou seja, por um lado, não se pode “reconhecer no povo nenhum superior” (MS IV, 314), por outro, não se pode reconhecer todos como independentes, pois muitos permanecem subordinados a um terceiro por força das necessidades econômicas. Uma vez mais, a atenção está em asseverar a possibilidade de participação racional na vida política e jurídica que, concretizada, torna-se expressão de conquista da maioridade, o que não se realiza apenas na democracia. O passo seguinte se dá na relação entre os Estados, pela instituição de uma federação na qual os entes estatais são compelidos a fazerem renúncias em prol da saída de um “estado de natureza”, sem deixarem de ser soberanos. Assim, como cidadãos cosmopolitas, para além das esferas estatais, todos são reconhecidos como autônomos, pela universalidade da razão. Este é o destino da humanidade: o progresso para o melhor, mesmo que o homem não queira, posto ser movido pela natureza, garantia desse sumo bem. A história é, assim, a execução do propósito supremo da realização de uma cidadania mundial lastrada na razão. E, nesse processo, o Direito ascende como elemento imprescindível. Perante o pensamento do filósofo de Königsberg surge o questionamento autoavaliativo sobre o progresso da humanidade hoje: quo vadis? Se de um lado o reconhecimento e a positivação de direitos humanos, assim como o adensamento das relações interestatais, inclusive com a criação da ONU, sinalizam a confirmação da sagacidade kantiana, a persistência, e em muitos casos, a disseminação, de violações à dignidade do homem, instrumentalizado, discriminado, excluído e mesmo eliminado, colocam em xeque a capacidade do Direito de ser garante da liberdade. Quais os limites do Direito para a promoção de um Estado comprometido com o homem e com a humanidade? Como alcançar a paz perpétua se nem direitos humanos básicos são concretizados? E o que sobre isso manifesta a crise das democracias? Acreditamos que a filosofia da história, enquanto interpretação da vida e desejo do melhor, pode contribuir para esclarecer os desafios e as possibilidades da contemporaneidade, uma vez que o esforço kantiano parte da política para desaguar em uma filosofia da história, da ordem dos Estados para uma ordem cosmopolita, enfim, para a humanidade. Os traços principais dessa empreitada são desenvolvidos na Ideia de história de um ponto de vista cosmopolita e A paz perpétua, obras que examinaremos em conexão com os meandros político-jurídicos do mundo atual, para fazer despontar respostas às questões ora levantadas.

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Publicado

2018-12-20

Como Citar

Almeida, I. A. R. de, & Santos, I. M. (2018). O desafio do progresso para o melhor: direito e paz perpétua da filosofia da história cosmopolita de Kant para o mundo contemporâneo. Annales Faje, 3(4), 133. Recuperado de https://www.faje.edu.br/periodicos/index.php/annales/article/view/4084